O direito ao trabalho seguro é materializado, dentre outras formas, por meio de cobrança de contribuição social prevista no art. 22, inciso II, da Lei nº 8.212/1991, denominada popularmente de “contribuição do Fator Acidentário de Prevenção”, ou “FAP”. Essa contribuição social serve de fonte de custeio do benefício previdenciário e de mecanismo de indução da atividade econômica. Uma vez que a alíquota da contribuição do FAP varia conforme a quantidade de acidentes de trabalho das empresas, a sua cobrança desincentiva práticas laborais prejudiciais a segurança do trabalhador.
Com efeito, de acordo com o referido art. 22 da Lei nº 8.212/91, é devido pelo empregador o recolhimento de contribuição social calculada sobre o total das remunerações pagas ou creditadas, no decorrer do mês, aos segurados empregados e trabalhadores avulsos, em alíquotas que variam conforme o risco de acidentes de trabalho de cada empresa. A lei estabelece alíquotas nestes termos:
a) 1% (um por cento) para as empresas em cuja atividade preponderante o risco de acidentes do trabalho seja considerado leve;
b) 2% (dois por cento) para as empresas em cuja atividade preponderante esse risco seja considerado médio;
c) 3% (três por cento) para as empresas em cuja atividade preponderante esse risco seja considerado grave.
Atualmente, a aferição do grau de risco de acidente de trabalho para aplicação das alíquotas do FAP baseia-se na tarifação coletiva das empresas, segundo o enquadramento das atividades preponderantes estabelecido na Classificação Nacional de Atividades Econômicas - CNAE. Por sua vez, o enquadramento das empresas no CNAE para efeito de recolhimento do FAP, bem como a metodologia desse enquadramento, encontra-se estabelecido pelas Resoluções do Conselho Nacional de Previdência Social - CNPS nº 1308 e 1309, ambas de 2009.
De acordo com o Ministério do Trabalho e Emprego, a metodologia aprovada pelos Regulamentos - CNPS nº 1308 e 1309, ambas de 2009 “busca bonificar aqueles empregadores que tenham feito um trabalho intenso nas melhorias ambientais em seus postos de trabalho e apresentado no último período menores índices de acidentalidade e, ao mesmo tempo, aumentar a cobrança daquelas empresas que tenham apresentado índices de acidentalidade superiores à média de seu setor econômico”(i). Depreende-se dos regulamentos que, para cada grupo e tipo de empresa, conforme atividade por ela desempenhada, vigora alíquota distinta, pressuposta.
Não obstante a indiscutível boa intenção da norma legal, que busca materializar benefício previdenciário essencial ao trabalhador, desde a modificação dos critérios para caracterização da atividade preponderante da empresa e do grau de risco da atividade realizada pelas Resoluções CNPS nº 1308 e 1309, de 2009, muito vem se discutindo sobre a constitucionalidade da contribuição do FAP. Ocorre que, a nosso ver, as alíquotas do FAP foram estabelecidas sem a observância dos princípios constitucionais fundamentais aplicáveis à tributação.
Em primeiro lugar, suscita-se a inconstitucionalidade da contribuição do FAP porque a matéria encontra-se integralmente regulada por regulamentos do Conselho Nacional de Previdência Social. Observe-se, não se trata de regulamentação por via de decreto, mas de regulamentação tributária feita por órgão do Poder Executivo, que não se encontra investido de competência para tanto. Nesse caso, há delegação da delegação da competência de regulamentar a norma jurídica, em frontal ofensa ao princípio da legalidade.
Observe-se, ademais, que a possibilidade de enquadramento deveria ser precedida de levantamento estatístico, segundo a lei. Com efeito, a Lei nº 8.212/91 exige que a alíquota do FAP tenha como base revisão, vistorias, inspeções junto às empresas. Todavia, isso não ocorreu. Não há dados públicos, possíveis de consulta pelos interessados, de verificação in loco dos riscos laborais. Houve, assim, patente violação aos princípios que regem os atos da administração: motivação, transparência, equidade. Com efeito, esses dados de vistoria deveriam ser públicos, de modo a demonstrar-se a efetiva necessidade de majoração da gradação.
Veja-se, ainda, que a alíquota da contribuição do FAP só pode ser definida mediante comparação com os dados gerais do segmento da atividade econômica, pois ele demanda comparação com o grau de risco de outras atividades semelhantes a fim de se estabelecer quais empregadores estão sujeitos, na média, a maior ou menor incidência de acidentes de trabalho. Contudo, esses dados não são públicos. Assim, o contribuinte não tem como comparar os dados, revisando o seu índice.
Por fim, cumpre verificar que a contribuição do FAP, tal como prevista com a modificação do art. 10 da Lei nº 10.666/93, está sendo usada com caráter de sanção. Ocorre que, a despeito de sua boa intenção, no momento em que toma por pressuposto a maior ou menor adoção de políticas de investimento de prevenção de acidentes, o fator modulador do FAP previsto nesse art. 10 passa a ser utilizado com caráter de sanção. Isso porque as empresas que não adotam as medidas de prevenção de acidentes são apenadas com tributação a maior. Esse procedimento é vedado pelo ordenamento jurídico, nos termos do art. 3º do Código Tributário Nacional.
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i http://www2.dataprev.gov.br/fap/fap.htm, consulta em 16/06/2010.
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